Infelizmente, isso é horrível. Permita-me explicar...
Na época em que a indústria ainda era dominada pela Sega e Nintendo, o mercado ainda era limitado: os chefões não sabiam do que a molecada curtia, e o custo de produção era bem alto, considerando que a empresa precisava de um produto para vender (principalmente na época de natal) e havia uma quantidade limitada de jogos que podiam ser publicados por ano. Ou seja: o jogo só era lançado se fosse BOM mesmo!
Enquanto isso, nos PC's, já tínhamos programadores cheios de criatividade, dispostos a criar tudo que lhe viessem à cabeça. Tudo feito para entretenimento próprio: um hobby. Podemos dizer que, antes desse monte de desenvolvedores indie aparecer, estes caras eram os indies do século XX.
E o que esses caras faziam com seus jogos? Distribuíam para os amigos, ou então ficavam para si mesmos. Os que sentiam que poderia ser uma ideia digna de ser levada adiante poliam suas obras e tentavam entrar na indústria. Se você precisa de alguma referência, Dangerous Dave (feito por John Romero) e a história da Apogee (criadores de Duke Nukem) estão aí. E qualquer pessoa que teve um PC até a década de 90 deverá conhecer pelo menos um desses nomes.
E o jogo era gratuito!
Uma coisa interessante sobre essa história é que, voltando um pouco mais atrás no tempo, você perceberia que os computadores eram extremamente limitados para se desenvolver um jogo: não havia API gráfica, nem compatibilidade entre plataformas de marcas diferentes. Aquelas pessoas eram não só bons programadores, como também ótimos matemáticos! Nem mesmo nos dias de hoje eu consigo entender como as paredes do Doom são desenhadas na tela... e Doom já tem mais de 10 anos de existência!
Uma equipe pequena em 1992 fez isso...
Porém, os indies do século XXI não são bem assim. A primeira coisa que você vai perceber é que, nos dias de hoje, todos os programadores desenvolvem jogos com o intuito de colocar em uma lojinha, bombar e ser o novo hit... E só. Não existe mais o sentimento de se estar construindo algo novo, nem de ir contra os gêneros genéricos da indústria. Todos os jogos são iguais: o mesmo gênero, o mesmo estilo, as mesmas desculpinhas esfarrapadas de desenvolvedor que não pode fazer algo melhor porque a equipe é pequena...
Sinceramente: isso é ridículo!
A primeira coisa que você percebe quando vê um jogo "indie" são os gráficos 8-bit. Chega até a ser engraçado quando você vê o trabalho de uma equipe pequena nascida nos anos 90 desenvolvendo engines 3D que definiriam a evolução gráfica no futuro, e depois vê uma equipe pequena nascida em 2010 usando a Unity3D para desenvolver uma cópia de algum jogo lançado para o Super Nintendo. Belo uso da tecnologia, rapazes! Infelizmente, não comprei um videogame de última geração para jogar a mesma porcaria que eu jogava há 20 anos atrás.
... enquanto uma equipe pequena em 2007 fez... errr... isso?!
Equipes pequenas demais para desenvolver um jogo grande? Quake foi criado por três programadores, e o criador da engine de Duke Nukem 3D tinha meros 17 anos! Não sabe desenhar? Se você realmente vai colocar essa coisa numa lojinha, e com preço ainda por cima, tome vergonha na cara e arrume um artista para fazer o serviço. Veja quantos jogos gratuitos graficamente bonitos você encontra Internet afora, em Flash. Você realmente acha que eu vou pagar para ter uma coisa inferior quando tem exatamente o MESMO jogo de graça por aí num Clickjogos da vida, e com gráficos melhores ainda por cima? Não, obrigado.
E já pararam para contar quantos jogos de plataforma esses caras criam? Para um grupo que as pessoas falam que "salvarão a indústria dos Call of Duties genéricos e sem graça", eu acho irônico ver que a grande maioria segue exatamente o mesmo gênero, com a mesma quantidade limitada de controles, com os mesmos gráficos ultrapassados, com o mesmo gênero de side scroller adotado e abusado pelos desenvolvedores há mais de 20 anos.
Já se foi o tempo em que eu sonhava em ser um desenvolvedor de jogos. No meu tempo, isso parecia ser algo inatingível, eu precisaria aprender muita coisa antes de seguir em frente. O que se vê hoje, porém, é que umas 20 milhões de pessoas escolheram, do nada, se tornarem desenvolvedores também. E aí você percebe que só 1% desse pessoal vai fazer algo que presta, e ainda sim vão precisar competir com as outras porcarias que fazem sucesso apenas por ter alcançado um nível de popularidade altíssimo, sabe-se lá como, e como tal conseguem a façanha de se tornarem lucrativos desprezando a qualidade em geral (ficam Flappy Bird e Red Bouncing Ball Spikes como referências).
Com isso, um monte de gente para de tentar inovar (complementando ainda mais a ironia de "salvar a indústria dos Call of Duties") e passa a tentar ser o novo alguma coisa: o novo Flappy Bird, o novo Minecraft, o novo FEZ... você escolhe.
[sarcasmo]Uma puta duma inovação isso aí, né?[/sarcasmo]
"Amamos os indies: a venda de SDK's nunca foi tão fácil!"
E mesmo que venda, esse dinheiro não vai todo para você: a dona do console pega uma porcentagem dos lucros e dependendo do que você usou para desenvolver o jogo, a dona da game engine também recebe dinheiro na história. É um modelo de negócio similar ao período de febre do ouro, onde você tinha um monte de pessoas viajando e apostando tudo que tinham para minerar e ficarem ricos, mas os únicos que realmente lucraram nessa história foram os comerciantes locais, que vendiam picaretas, pás e todo tipo de equipamento aos entusiastas.
O desenvolvedor indie de 1848.
Essa corrida desesperada do "novo jogo de sucesso" aconteceu no Atari 2600 e tivemos como consequência o crash de 1983. Agora, está começando tudo de novo, e seria muito bom se isso acontecesse: acalmaria os ânimos dessa gente que nem sabe o que é um jogo, mas que faz mesmo assim, em busca de um sucesso que, no final das contas, é uma pura ilusão.